quinta-feira, 18 de janeiro de 2018

   

  CENSO ESCOLAR E AS QUESTÕES ÉTNICO RACIAIS 

Este sexto eixo do Curso de graduação em Pedagogia PEAD/UFRGS, teve como seu ponto principal de estudos e reflexões a diversidade presente no cotidiano escolar e suas implicações. 
A interdisciplina Questões Étnicos Raciais na Educação: Sociologia e História, permitiu uma forte provocação com relação a reflexão desta diversidade, sua trajetória histórica, as manifestações das diferenças culturais no ambiente escolar e a luta contra a discriminação e o preconceito racial, sendo a postura e atuação docente um forte instrumento para a educação da diversidade.
Através do estudo de diversos referenciais teóricos, pesquisa acadêmica, discussões concernentes ao tema da diversidade e preconceito e a observação dos dados das turmas, é possível verificar a veracidade da existência da diversidade na escola, sua interculturalidade  e, infelizmente a presença de situações de discriminação e preconceito com relação a diferença racial.
No período de encerramento do ano letivo de 2017, foi realizada em uma Escola na zona sul de Porto Alegre, o levantamento de dados da turma do primeiro ano do ensino fundamental, o censo escolar. Um fato muito significante na sistematização destes dados, além da confirmação da existência de uma visível diversidade racial na escola, é a dúvida das pessoas em relação a sua identidade cultural ou racial, e ainda, a omissão de algumas pessoas com relação a declaração da raça negra/preta. “A cor é uma metáfora de raça, isto é, uma categoria acionada para demarcar diferenças e desigualdades raciais”(ARAÚJO,1987).
O censo escolar é um levantamento estatístico sobre a educação básica no Brasil, onde cada Escola  disponibiliza dados relacionados a instituição e aos alunos, para que se tenha um maior conhecimento da comunidade escolar ,podendo assim organizar estratégias para a educação desta comunidade. As questões raciais estão presentes no censo escolar, com o objetivo de acompanhar esta diversidade e buscar formas de promover uma educação igualitária e antirracista. O INEP, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, dispõe atualmente de diversos instrumentos de coleta de dados escolares, buscando aprimorar a coleta de dados raciais nesses instrumentos, ampliando o debate sobre as desigualdades raciais na educação brasileira.
 “A problemática da diversidade no Brasil, embora apareça nas discussões educacionais nos anos 1990, é antiga, acompanha a história de lutas por inserção cidadã na sociedade empreendidas por indígenas, negros, sem-terra, empobrecidos, outros marginalizados pela sociedade” (SILVA,1993).

É de extrema importância para a construção de uma educação igualitária de apoio a diversidade que se tenha as informações sobre quem é o aluno de nossas escolas e como esta diversidade se dá. A declaração com respeito a raça, a cor e a etnia nas pesquisas educacionais trazem uma forte relevância com relação  a valorização do aluno e sua cultura.“ Classificação racial não se baseia estritamente no aspecto físico, como também na posição social do indivíduo” (COSTA,1974).
As definições de raça e cor são discussões constantes quando se trata de políticas públicas para a diversidade, assim como, é também assunto polêmico nas pesquisas educacionais como o censo escolar. A cor, desde muito tempo, traz  uma categoria nativa, ligada a diferenciação entre cidadãos livres ou escravos, descendentes de africanos ou dos povos europeus. “A cor foi o principal conceito utilizado nas relações sociais do Brasil para classificar pessoas”(GUIMARÃES,2003).
As discussões atuais nestes setores estão voltadas a modificar tais denominações por termos vinculados a etnia. Enquanto o conceito de raça é uma ferramenta de exclusão e hierarquização de povos e culturas, os grupos étnicos seriam aqueles dotados de algum grau de coerência e solidariedade, de pertencimento, de compartilhamento de diversos atributos culturais, como linguagem, religião, tradições, monumentos históricos e território. “O termo etnia transmitiria uma ideia de pertencimento ancestral, remetendo a origem e interesses comuns”(GOMES,2005). 
A história do negro no Brasil, todo o escravismo e a trajetória de inferioridade em relação ao branco, a chamada superioridade branca, abriram as partas para o ocultamento da diversidade, desvalorizando as relações culturais entre o branco e o negro e fortalecendo o racismo.
Já no início da história deste país, o índio aparece como uma figura inferior , desvalorizada e sem cultura, que também foi escravizado e, apesar de forçado a renunciar sua própria cultura por ser considerada não civilizada é um personagem de grande formação cultural no cenário brasileiro. “O Brasil, antes de ser descoberto, não tinha cultura de espécie alguma; não haviam vilas e nem cidades, estava pelo contrário, todo coberto de mato e era habitado por muitas tribos de índios selvagens”(1927,p.7).            
  O preconceito racial e a discriminação se apresenta de diversas formas em nossa sociedade, Na escola, lugar de grande diversidade, isto não é diferente. É possível observar que a trajetória de luta por igualdade, assim como, o sofrimento trazido pelo racismo, trouxeram como resultado uma perda significativa na construção da identidade brasileira. Sabemos que nosso país , com uma formação multicultural, é permeado de uma miscigenação natural, mas a fuga do racismo, traz uma forte negação com relação a raça negra. Temos negros que preferem declarar que são pardos e brancos que se dizem pardos, tentando dizer que não são racistas. Este cenário, presente na sociedade atual de modo geral, tem na Escola um lugar de representação, onde o encontro de diferentes culturas acontecem e onde as situações de preconceito e discriminação aparecem desde a infância, lugar este de muito poder de reflexão social e formação de caráter democrático que implica muito na sociedade, a qual se deseja muito  modificar.

"A questão racial não é exclusiva dos negros. Ela é da população brasileira. Não adianta apoiar e fortalecer a identidade das crianças negras se a branca não repensar suas posições. Ninguém diz para o filho que deve discriminar o negro, mas a forma com que trata o empregado, as piadas, os ditos e outros gestos influem na educação."(CANDAU, 2003,p.29,30)
O fato de existir uma diferença histórica de desigualdade das populações negras em relação ao branco é evidenciado, principalmente quando se trata de escolarização, acesso a universidade e formação profissional. Segundo o IBGE, esta diferenciação na educação das populações negras são instrumentos de inferiorização e estigmatização social do negro nas relações sociais atuais.
 Um marco na trajetória da luta contra o preconceito e a busca da valorização cultural da população negra nas instituições de ensino deste país, foi a criação da lei 10.639/2003 que torna obrigatório o ensino de história e cultura afro brasileira e africanas no currículo oficial da Educação Básica e inclui no calendário escolar o Dia Nacional da Consciência Negra, o dia vinte de novembro. É notável   que existe por parte do governo brasileiro, o conhecimento da existência destas manifestações de discriminação e preconceito e o desejo de uma educação igualitária, pois percebemos a criação de diversas políticas públicas e educacionais que corraboram neste sentido, tendo como exemplo a criação das cotas raciais para ingresso em universidades e concursos públicos, os Parâmetros Curriculares Nacionais ,que trazem o tema transversal Pluralidade Cultural, e o Plano de Ação para a Inserção das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnicos Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro Brasileira e Africana, que tem como principais princípios a socialização e visibilidade da cultura negro-africana, formação de professores com vistas a sensibilização e a construção de estratégias ao combate das discriminações, construção de materiais didáticos-pedagógicos que contemple a diversidade étnico-racial nas escolas e assim por diante.
Mas de nada adianta as políticas públicas ,se não houver um movimento reflexivo nas escolas por meio da intervenção pontual dos educadores na construção de uma cultura antirracista, de valorização da sociedade multicultural em que vivemos e através do ensino da história e da formação cultural brasileira. Não se trata de falar de cultura africana no dia vinte de novembro, ou ainda enaltecer o índio no dia dezoito de abril, mas sim de assumir uma postura de apoia a diversidade. O ocultamento da diversidade é gerador do preconceito e opressão racial.
As relações entre os sistemas de ensino, as comunidades e a relação professor aluno são instrumentos de mudança social.
 É emergente que se ultrapasse os estereótipos e se busque formar cidadãos participativos e democráticos, capazes de combater as discriminações e preconceitos e ter a consciência da formação cultural brasileira, valorizando as relações multiculturais que constituem a sociedade brasileira, e este pensamento que deve e pode ser provocado na escola, por meio de uma educação na e para a diversidade , deve ultrapassar o ambiente escolar e tornar-se instrumento de mudança social. “Consciência política e história da diversidade, fortalecimento de identidades e de direitos, ações de combate ao racismo e a discriminações”(BRASIL,2004b,p.17).




Referências bibliográficas:
ARAÚJO, T. C. A Classificação de  “Cor” nas Pesquisas do IBGE: Notas para uma Discussão. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n.63,p.14 a 16,1987.
BRASIL. Resolução CNE/CP 1/2004.Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnicos Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana.Brasília,2004B.
CANDAU, Vera Lúcia. Somos todos iguais? Escola, discriminação e educação em direitos humanos.- Rio de Janeiro: DP&A, 2003.
COSTA, T.C.N.A.O Princípio Classificatório da “Cor”, sua Complexidade e Implicações para um Estudo Censitário. Revista Brasileira de Geografia, Rio de Janeiro,v.36,n.3,p.91 a 103,1974.
GOMES, N.L. Alguns Termos e Conceitos presentes no Debate sobre Relações Raciais no Brasil: Uma Breve Discussão. In: SECRETARIA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA, ALFABETIZAÇÃO E DIVERSIDADE. Educação Antirracista: Caminhos Abertos pela Lei Federal nº10639/03.Brasília,DF:MEC/Secad,2005.p.39-62.
GUIMARÃES, A.S.A. Como Trabalhar com “Raça” em Sociologia. Educação e Pesquisa, São Paulo,v.29,n.1,p.93-107,2003.
HISTÓRIA RESUMIDA DO BRASIL,1927,P.7.
SILVA, Petronilha B. G. e Diversidade Étnico Racial e Currículos Escolares-Dilemas e Possibilidades. Cadernos CEDES,Campinas,n.32,p.25-34,1993.